sexta-feira, 7 de novembro de 2008

PF quebra sigilo telefônico sem autorização da Justiça

Por Lilian Christofoletti
na Folha de São Paulo

Na investigação aberta para apurar o vazamento de informação da Satiagraha, a Polícia Federal conseguiu, sem autorização judicial, a quebra do sigilo telefônico de dezenas de aparelhos da Nextel utilizados na madrugada em que a operação foi deflagrada. O objetivo foi identificar os aparelhos usados por jornalistas da TV Globo.Segundo a Folha apurou, a PF queria descobrir se o delegado Protógenes Queiroz, que comandou a Operação Satiagraha, ou algum dos seus subordinados avisou os repórteres sobre a operação.Questionada ontem sobre o fato, a Nextel emitiu uma nota lacônica: "A Nextel informa que, neste e em outros casos, tem seguido estritamente as determinações judiciais a ela requeridas".A assessoria da TV Globo informou que não "se manifesta em questões sub judice".As informações da Nextel à PF com os números dos telefones foram anexadas ao inquérito e serviram de base para as ordens de busca e apreensão autorizadas pelo juiz federal Ali Mazloum, da 7ª Vara Criminal Federal, contra Protógenes -a PF vasculhou a casa do policial em Brasília, um quarto de hotel, em São Paulo, e o apartamento de um filho dele, no Rio.Há no inquérito a relação de 10 a 12 aparelhos da Nextel, com os respectivos Cell ID -número de identificação e antenas, o que permite a localização física do usuário do aparelho. Constam ainda as horas em que as ligações foram feitas. Segundo a Folha apurou, a PF obteve também a lista de chamadas e ligações recebidas de cada aparelho, mas ainda não a anexou aos autos.Não há a transcrição de conversas telefônicas.Quando a Satiagraha foi deflagrada, na madrugada de 8 de julho, foram feitas buscas e apreensões contra 17 pessoas, entre elas o banqueiro Daniel Dantas, o investidor Naji Nahas e o ex-prefeito Celso Pitta.
O pedido
No início da investigação sobre o vazamento, o delegado Amaro Vieira Ferreira, da Delegacia de Polícia Fazendária em São Paulo, indicado para a função pela Corregedoria da PF, enviou ofício diretamente à Nextel pedindo a relação completa de "todos" os celulares e antenas usadas nas imediações da sede paulista da PF e em três locais alvos de buscas durante a deflagração da Satiagraha.Nos quatro locais havia equipes de jornalistas da TV Globo antes mesmo da chegada da PF. Um dos endereços é a casa do ex-prefeito Celso Pitta. A prisão dele, ainda de pijamas, por volta das 6h, foi filmada por uma equipe da TV da Globo.A Folha apurou que outras autoridades do caso foram consultadas pela PF sobre a quebra de sigilo telefônico dos jornalistas que estavam nos locais de busca, e se opuseram ao pedido, entendendo que tal iniciativa violaria o direito constitucional de sigilo da fonte.Mesmo assim, a PF encaminhou o ofício à Nextel sem autorização da Justiça.Num primeiro momento, a empresa de telefonia informou que não poderia repassar os dados sem a autorização judicial. Depois, a Nextel, em outro documento, informou que, "em face de esclarecimento verbal prestado por um agente federal", disponibilizaria as informações. Os dois ofícios da Nextel estão nos autos.O procurador da República Roberto Dassié, que atua no caso, se manifestou contra a intenção da PF de quebrar o sigilo dos jornalistas para tentar descobrir quem os avisou da operação. A posição de Dassié consta dos autos. Para ele, se o investigado era Protógenes, apenas os celulares dele deveriam ter o sigilo quebrado.Na manifestação, o procurador pede ainda à PF que esclareça expressamente o objetivo da medida e que junte aos autos todos os documentos do caso, sob pena de cometer o crime do artigo 305 do Código Penal (subtração de documento de que não pode dispor).A PF enviou ofício ainda ao Detran (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo) e ao DSV (Departamento de Operação do Sistema Viário), da Prefeitura de São Paulo, para que informassem " todas" as multas aplicadas durante a madrugada do dia 8. O objetivo seria tentar rastrear o trajeto das equipes da Globo. Os pedidos estão nos autos, mas ainda não foram respondidos.
Polícia Federal
A assessoria de imprensa da PF de Brasília disse, sem se referir ao caso, que nenhum dado sigiloso é obtido de forma direta, sem a autorização da Justiça Federal. Às 17h20, a assessoria afirmou que o superintendente da PF de São Paulo, Leandro Coimbra, falaria sobre o episódio. Procurado, às 17h25, a assessoria da PF-SP disse que desconhecia a orientação da PF de Brasília e que o assessor de Coimbra não estava na sala.Às 17h45, a reportagem ligou novamente e foi informada de que o superintendente já havia partido. O juiz Ali Mazloum não falou sobre o assunto.

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