sábado, 22 de novembro de 2008

Um direitista no diálogo freireano

Quinta feira foi corrida. Como o pior deste período de final de curso já passou posso voltar à intensidade dos escritos aqui.

Estava eu quinta de manhã apresentando um trabalho no núcleo livre de Educação de Jovens e Adultos (núcleo livre é matéria fora da área do seu curso que, tipo assim, não é obrigatória, mas se você não a fazer no mínimo doze, não forma). Escolhi este núcleo livre porque era o único que tinha vaga. Fazer o que? Já esperava o que iria enfrentar.

Há um tempo atrás eu acreditava muito nas palavras de Paulo Freire. Se não li todos, pelos menos 90% da obra dele eu já li. É muito bonito. Um mundo onde todos são irmãos, onde todos são autônomos, não existem desigualdades e o amor está no coração de todo mundo. Dos meus 17 aos 22 anos eu acreditava nas palavras dele. Depois, com a finalização do meu processo de “desesquerdização”, critico, discordo. Esta idéia vinda de Rousseau de que o homem é bom, mas a sociedade o corrompe não cola. Não quero viver isolado numa floresta. Quer fazer trilhas numa floresta, mas isolar da sociedade só se for para um Mosteiro Beneditino. E por vontade própria. Esta história de que a culpa é da sociedade não cola. Sigamos.

Quinta era dia do grupo que fazia parte apresentar o seminário que valia nota. E, repetindo José Trajano que, por sua vez, repete Zé Trindade, “vejam vocês o que é a natureza”. Adivinhem o tema que caiu nas mãos do meu grupo? “Os movimentos sociais e a educação do campo”. Um dos alvos prediletos deste blog. A galera que está aí no poder defende e tem suas origens nestes tais movimentos sociais. Eles se acham no dever de rasgar a Constituição para implantar a justiça social que eles acham ser ideal. É claro que eu ia mostrar minhas críticas, minhas discordâncias.

Via o pessoal na sala. A maioria era mulher, pois o curso de Eja é ministrado na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás. Enquanto meus colegas expunham seus pontos, via a cara de sono das meninas, a cara de desânimo, a vontade louca de acabar tudo aquilo e ir embora. Sei lá o que elas fizeram na noite anterior. Só sei que estavam nem aí para o que era dito. E o que os movimentos sociais pregam sobre a educação? Aquela frase que já virou chavão no curso de Pedagogia: “Compreender a realidade do aluno”. Até isso a esquerda quer roubar: a realidade do aluno. (Senhor, piedade desta alma que escreve este texto porque acreditou nestas porcarias).

Chegou minha vez de falar. Falei o que o livreto com as referências para políticas educacionais no campo do governo federal (isso mesmo, dinheiro nosso) bancou. Primeiro falei o que o livreto escrevia, descrevendo cada passo. Aí chegou a hora da polêmica. Eu disse: “Professora, eu tenho algumas críticas a fazer, mas, já deixo claro, que são minhas as críticas e não do grupo. Não sei se o grupo concorda.” E lá vou eu questionar desde o livreto pago com dinheiro público e que beneficia apenas a patota governista até a massificação que os líderes esquerdistas desejam ardentemente. Minha professora me olhava meio de lado, como quem não estava concordando. Toquei num ponto que o livreto falava que sua elaboração partiu do debate entre os vários grupos que estavam ligados ao campo. E elogiava os grupos como MST e Comissão Pastoral da Terra. Aí perguntei: “Cadê a UDR, a União Democrática Ruralista? Ela também não é um grupo que atua no campo? Por que a UDR não participou da elaboração deste livreto?”. Minha professora respondeu que a UDR faz parte sim dos grupos que atuam no campo, mas não estão interessados em alfabetizar os trabalhadores do campo para a sua libertação. Enquanto a professora exaltava os movimentos sociais em detrimento da UDR eu olhava o ânimo da turma. Pensei que não poderia alongar minhas críticas porque além da turma querer acabar logo com aquilo eu tinha que resolver outros problemas. A professora é uma entusiasta da compreensão da realidade do aluno. E a realidade do aluno naquele momento era sono, cansaço, desinteresse. E ela continuava falando dos movimentos sociais.

Não que eu defenda a UDR, mas acho que, baseado nas palavras do livreto de referências para uma política de educação do campo bancada com dinheiro público não deveria privilegiar apenas os movimentos sociais amigos dos cupanheros de Brasília. Mas somos nós os direitistas que não sabemos dialogar e temos preconceito do MST. Eles sim sabem dialogar. Sabem tanto que excluem o adversário de uma roda bancada com dinheiro “dupovu”. Voltarei a este assunto de “diálogo”.

Depois critiquei a massificação que estes movimentos sociais fazem. Defendi o indivíduo, não o cara com o boné do MST. O indivíduo que aprende a ler e escrever e procura com seus próprios esforços melhorar de vida, que possa ler a Constituição e saber quais são seus deveres e direitos e que não seja manobrado por João Pedro Stédile que nunca sai da direção do MST (seria uma ditadura?). Meus colegas de grupo já me cutucavam para encurtar a conversa. A professora retruca. Eu escuto. A sala dorme. “O indivíduo é importante, mas ele sozinho faz pouca coisa, é preciso se unir...” e todo aquele blá-blá-blá esquerdopata-freireano. Eu sou o preconceituoso. Os movimentos sociais não são preconceituosos com seus adversários. Eles querem o diálogo amoroso com todo mundo... da sua patota. Fechei minha fala questionando o que sairia de um debate entre Ronaldo Caiado, representando a UDR e João Pedro Stédile do MST. A professora acredita que deste diálogo pode-se extrair coisa interessante. Bem, sabendo que Stédile não anda sozinho e que só participa de eventos onde possa levar sua torcida, dificilmente uma voz oposta ao líder dos sem terra seria ouvida.

Depois da apresentação um colega da turma me procurou. Disse concordar comigo sobre o indivíduo contra a massa. E acrescentou uma coisa bem interessante: a esquerda prega uma coisa e faz o contrário. Perguntei que curso ele fazia. Jornalismo. Ainda bem que existem indivíduos com pensamento próprio se formando neste curso.

Um direitista no diálogo freireano nunca terá vez. Ou sono da platéia, ou justificativas para os tais dos movimentos sociais excluírem seus adversários das discussões sobre referência de políticas educacionais do campo financiado pelo governo federal. É muito bonito falar de amor. Mas este amor escrito pela esquerda tem direção: seus cupanheros. Os adversários que fiquem com o sono dos ouvintes.

Um comentário:

Anônimo disse...

É muito bonito falar de amor. Mas este amor escrito pela esquerda tem direção: seus cupanheros. Os adversários que fiquem com o sono dos ouvintes, é encantador.
Maravilhoso todo o texto.