quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Reforma política em causa própria

Por Márcio Falcão
no Jornal do Brasil

A estratégia do Palácio do Planalto de encaminhar a proposta de reforma política ao Congresso de forma fatiada, com cada tema sendo tratado de forma isolado, foi bombardeada ontem em audiência pública na Câmara. Para representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e analistas políticos, ao desvincular os temas da reforma o governo serve apenas aos interesses dos congressistas, que só deverão se mobilizar para votar matérias que lhes beneficiem.
A proposta do governo está em consulta popular e prevê cinco projetos de lei e uma proposta de emenda à Constituição que tratam de cláusula de desempenho, lista fechada, financiamento público de campanha, inelegibilidade, fidelidade partidária e fim das coligações partidárias. Os governistas rejeitam as críticas e esperam ver aprovadas as medidas com mais facilidade, uma vez que tentativas anteriores ocorreram e foram mal-sucedidas porque, segundo o ministro da Justiça, Tarso Genro, tramitaram em bloco.
– Essa reforma é como um labirinto - disse Tarso. – O que um labirinto nos ensina é que é necessário percorrer um caminho. Ele não ensina qual é a saída.
Na avaliação dos especialistas, teriam atenção dos parlamentares a fidelidade partidária e a inelegibilidade, que já teriam efeitos práticos nas eleições de 2010.
– Os temas são bons, mas precisam ser amplamente debatidos e discutidos conjuntamente - declarou o ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcelo Lavenère. – O Legislativo, o Executivo e a sociedade civil precisam ter vontade de fazer realmente uma reforma e não apenas arranjar soluções paliativas.
O projeto do governo que flexibiliza a fidelidade estabelece uma janela para a troca de partido de até 30 dias antes do prazo de filiação (seis meses) para disputar a eleição. O prazo pode ser alterado porque todos os projetos estão em consulta popular e só serão oficializados pelo governo no final do mês.

Sem bandeiras

O ministro das Relações Institucionais, José Múcio, defendeu a idéia do governo explicando que não se pode engessar o sistema partidário. Múcio lembrou que na última legislatura um parlamentar mudou seis vezes de partido em busca de cargos e posição de maior destaque. Para o ministro, a infidelidade tira das legendas as suas bandeiras de luta, mas não pode impedir o aprimoramento do sistema político.
– O que é preciso mesmo é fortalecer os partidos – disse Múcio. – Hoje, não há mais bandeiras, programas e com isso o parlamentar vai embora.
Outra proposta que deve ser prioridade no Congresso é a proposta que trata da inelegibilidade. Tarso disse que o ideal é a criação de um colegiado de juízes nos Tribunais de Justiça dos Estados, dando celeridade às cassações das candidaturas e dos mandatos. O ministro criticou a perseguição ao político "ficha-suja" que não foram condenados em todas as instâncias. De acordo com o ministro, pessoas que respondem a muitos processos, mesmo sem julgamento definitivo, deveriam ter seu pedido de candidatura aceito.
Uma preocupação de analistas, como a assessora de Política Fiscal e Orçamentária do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Eliana Magalhães, é que pontos como o enxugamento dos partidos termine no esquecimento por falta de interesse dos parlamentares. O governo sustenta que a existência de 27 siglas faz com que muitas sejam usadas apenas para negociar tempo no horário eleitoral gratuito. A proposta do governo traz uma espécie de cláusula de barreira, que segundo o ministro pode começar a valer a partir de 2010, "ou outra data a ser definida pela Câmara", que levaria o país a ter 12 partidos.

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