sábado, 15 de novembro de 2008

Crise não intimida novos gastos

Por Márcio Falcão e Karla Correa
no Jornal do Brasil

Uma das receitas para blindar as economias diante da crise de crédito é cortar gastos e aplicar bem o dinheiro público. Em Brasília, a recomendação ainda está longe de ser seguida. No Executivo e no Congresso, os possíveis efeitos ainda são considerados uma "marolinha" - como disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva - e não assustam ministros e parlamentares que batalham para garantir cada um o seu quinhão.
Estão em jogo a criação de 8 mil cargos, reajustes para 473 mil servidores e até perdão bilionário para filantrópicas. Um custo extra de mais de R$ 44 bilhões até 2011. Na avaliação de especialistas, o governo caiu na própria armadilha, uma vez que lançou as medidas antes do estouro da crise e, agora, como precisa construir capital político para a sucessão presidencial de 2010 não terá coragem de frear o aumento dos gastos com custeio e inflar os recursos reservados para investimento.
– A lógica de se elevar os gastos para fazer frente à crise só funciona em seus momentos mais agudos, como forma de política anti-cíclica e, mesmo assim, os gastos devem acontecer na área de investimentos, não em despesas de custeio – critica o especialista em contas públicas da Tendências Consultoria, Felipe Salto.
De acordo com o analista, o discurso repetido pelo presidente Lula, de que a crise atingirá o país de forma mais amena do que em episódios passados porque o "governo fez o dever de casa", está correto apenas em parte.
– Tivemos um longo período com o superávit primário (espécie de poupança fiscal feita pelo governo) baseado no crescimento econômico, no boom da arrecadação, e o governo deveria ter aproveitado esse momento para reduzir o volume de despesas de custeio, enxugar o funcionalismo, frear os aumentos nos salários – ponderou Salto. – Não foi o que aconteceu e o equilíbrio fiscal vai ficar em segundo plano.
A idéia do governo é melhorar a composição dos gastos e não simplesmente cortar. O presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Marcio Pochmann, explica que é preciso atacar os juros. Na sua avaliação, tirando juros e investimento, as outras contas são de serviço.
Os ministros do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Patrus Ananias, da Educação, Fernando Haddad, e da Integração Nacional, Geddel Vieira Lim, foram os primeiros a mostrar que não têm receio da crise. Foram ao Congresso pedir a aprovação de projetos que permitem a contratação de novos funcionários para suas pastas. Patrus defende 164 cargos comissionados, aqueles que não precisam de concurso público, pelo custo de R$ 13,8 milhões. Haddad pede 2,8 mil cargos de professor universitário e 5 mil técnicos para as universidades federais, com um impacto de R$ 15 milhões. Geddel espera a criação de 172 vagas comissionadas.

Aval

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, reconheceu a reivindicação dos colegas de Esplanada como legítima e argumentou que há previsão destes custos no Orçamento de 2009 e no plano plurianual (PPA). Só em 2008, o governo criou quase 80 mil cargos públicos - um custo de R$ 30 bilhões se todas as vagas já estivessem ocupadas. Outro gasto que o governo vai ter que absolver são os reajustes. Neste ano, os aumentos salariais concedidos ao funcionalismo federal vão consumir R$ 11,5 bilhões e o gasto total com a folha de pagamento será de R$ 133,3 bilhões. Em 2009, a previsão é de que os servidores custem R$ 155,3 bilhões, com 15 mil novos cargos.
Parte desses custo adicional o Senado vota nesta semana. Estão na pauta da Casa, as medidas provisórias 440, que concede um reajuste salarial para 91.308 servidores civis da Receita Federal, fiscais do Trabalho e diplomatas - num total de R$ 20,4 bilhões e 441, que aumenta os vencimentos de cerca de 380 mil servidores de 40 carreiras e representa R$ 8,9 bilhões até 2011.
O presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), diz que não arcará com o desgaste de votar contra.
– O governo precisa parar de jogar para a arquibancada o tempo todo.

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