no Jornal Opção
Se a maquinaria especulativa de Brasília e Goiânia estiver certa, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, está antenadíssimo na possibilidade de mais uma aventura eleitoral em Goiás. Sua intenção seria concorrer ao governo do Estado em 2010, provavelmente vinculado à base de partidos aliados ao presidente Lula da Silva. Se isso for verdade, é preciso reconhecer que Meirelles seria um daqueles políticos que não temem assumir desgastes. Ao presidir mais uma reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na semana passada, ele encarnou o desgaste de outra elevação na taxa básica de juros (Selic), que passou de 13% para 13,75%. O que significa aumentar os juros de um país? Para o Banco Central, que há anos segue a mesma cartilha, significa desacelerar a economia e manter o aumento de preços o mais próximo possível do regime de metas inflacionárias — para o próximo exercício, a meta é de 4,5%. Para alguns especialistas, entretanto, essa receita significa aumentar a dívida pública e algo mais sinistro: como os investimentos capazes de alavancar o desenvolvimento do país são articulados com muitos meses (às vezes anos) de antecedência, a freada será sentida no próximo ano. Ou seja, ao majorar os juros pela quarta vez consecutiva, o BC acaba de plantar um crescimento econômico apenas residual para 2009 — se o cenário internacional não melhorar, fala-se até em pequeno encolhimento do PIB. Para o economista Everaldo Leite, a elevação da taxa de juros foi bem típica do Banco Central. "Mostra o quanto eles são conservadores", diz o especialista. Leite acredita que a receita do BC é inadequada, pois aumentar os juros só seria justificado no caso de uma "inflação de demanda" — quando os preços sobem em função do crescimento do consumo. O país, segundo ele, enfrenta uma "inflação de custo", com os preços sendo afetados mais diretamente pela elevação dos custos de produção do que pelo crescimento da procura. "O governo deveria poderia atacar o problema diminuindo os preços administrados (por agências reguladoras), como o da energia, da água e dos combustíveis, além de reduzir a tributação". Só que este governo, continua o economista, não tem interesse nessas medidas porque precisa financiar suas dívidas e garantir a estabilidade. Outro economista de Goiás, Luiz Alberto Gomes de Oliveira, tem opinião semelhante. De acordo com ele, o BC foi coerente com o seu objetivo de atingir a meta inflacionária em 2009, mas talvez tenha exagerado na dose ao aumentar a Selic em 0,75 ponto percentual. "A economia tem emitido sinais claros de desaceleração", diz ele, lembrando que o prejuízo maior dos juros altos acaba ficando com o próprio governo, porque é o maior devedor. Como o impacto dessas medidas só aparecerá mais claramente dentro de seis a nove meses, Oliveira afirma que será preciso esperar para confirmar se elas são acertadas ou não. Para o economista é razoável supor um crescimento econômico menor no próximo econômico.
Pé no freio na economia. Traduzindo para a política quer dizer que, se o presidente do BC está mesmo pensando em se cacifar como pré-candidato, seria no mínimo improdutivo passar o próximo ano inteiro evitando a pecha de responsável por mais um ano de crescimento lento ou nulo. Assim como a economia, a política possui uma série de variáveis imprevisíveis e outra série composta por fatores bastante previsíveis. De uma coisa Meirelles pode ter certeza (ou considerá-la como uma constante): caso entre na disputa para valer, seus adversários não vão poupar nenhum detalhe. Vão bater com gosto de gás — para usar uma expressão muito usada por políticos do interior do Estado. Aliás, não apenas os eventuais adversários diretos associariam o presidente do BC ao aperto monetário. Como vem ocorrendo com freqüência, a máquina de propaganda do PT (muitas vezes despertada a partir dos corredores do Ministério da Fazenda ou do Ipea) continuaria atirando em Meirelles com um duplo objetivo. Pode parecer o velho debate entre desenvolvimentistas e monetaristas ou entre a esquerda e a direita, mas não é só isso. O objetivo subterrâneo é eximir Lula dos desgastes de uma possível freada no crescimento e atingir o PSDB — já que ainda consideram Meirelles uma espécie de tucano. Para ver como batem, basta entrar no site oficial do PT e fazer uma busca com o nome do goiano. O presidente do BC é figura carimbada no portal petista (50 textos citam o seu nome). Muitos deles apenas reproduzem notícias positivas do BC. Mas há outros em que alguns movimentos sociais, como UNE e Conam, além da CUT, todos vinculados ao partido, se revezam em críticas pesadas à política monetária. Até um dirigente partidário pega a palmatória. Em vários artigos, alguns deles irônicos, Valter Pomar, secretário de Relações Internacionais, sugere que Meirelles é um entrave e diz ter pena de Lula por ser obrigado a aceitar um neoliberal em seu governo. Caminhando em um terreno político nebuloso, Meirelles também precisaria se ver com o setor produtivo, ainda o maior financiador de campanhas (pelo menos em Goiás) e crítico contumaz dos juros altos. Uma prova do "clima bom" entre eles aconteceu logo após a divulgação da ata do Copom, quando a Fiesp divulgou uma nota oficial simplesmente classificando o 0,75% como uma burrice. A revolta tem os seus motivos. O Brasil tem a mais alta taxa real de juros (descontada a inflação) do mundo, bem superior à do segundo colocado (Turquia). Pouca gente ganha diretamente com essa situação. Se bem que é verdade que esse pessoal tem investido cada vez mais em campanhas eleitorais. No campo eleitoral, o desafio é traduzir uma medida supostamente impopular (os juros altos e eventual desaceleração da economia, com perda de renda e empregos) em algo que beneficia diretamente o eleitor.
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