sábado, 5 de janeiro de 2008

R$ 41 bi não são reserva, mas contas a pagar

Por Marta Salomon
na Folha de São Paulo

Motivo de comemoração pelo governo federal, o saldo recorde de compromissos de gastos -os chamados empenhos- acumulado no final de 2007 é alvo de duras e reiteradas críticas do TCU (Tribunal de Contas da União). Para o tribunal, a prática, a que o governo já recorreu em anos anteriores, em dimensão menor, é sinal de má gestão dos recursos públicos.O ministro Paulo Bernardo (Planejamento) ostentou anteontem uma "reserva" de R$ 41 bilhões, dinheiro que poderá ser gasto independentemente da aprovação da lei orçamentária de 2008 pelo Congresso, atrasada por causa da não renovação da CPMF.Trata-se, na verdade, de um saldo de contas a pagar -e não de sobra de dinheiro. As despesas empenhadas em 2007 e não pagas até 31 de dezembro terão de ser honradas com os tributos arrecadados neste ano.Até mesmo o número divulgado pelo ministro é incerto. Confrontado ontem por informações diferentes registradas no Siafi (sistema de acompanhamento de gastos federais), Bernardo informou, via assessoria, que o número divulgado por ele havia sido repassado pela Secretaria do Tesouro, do Ministério da Fazenda.Já a Fazenda disse que os números finais dependem do processamento de dados que só será concluído na próxima quarta. Parte das despesas empenhadas poderá ser cancelada.Segundo dados do Siafi, o governo começou 2008 com um saldo de R$ 31 bilhões de investimentos já empenhados e não pagos. Somado às demais despesas discricionárias, que supostamente podem ser alvos de cortes, o saldo ultrapassa R$ 80 bilhões. Na prática, os empenhos de despesas em ritmo frenético no final do ano (47% dos compromissos de gastos em investimentos foram lançados em dezembro) ajudam o governo a fazer investimentos independentemente da aprovação da nova lei orçamentária.Mas esse comportamento, rotina nos últimos anos, obscurece o resultado fiscal, já que verbas empenhadas não são consideradas gastos. Pior: o volume de contas não pagas compromete os tributos arrecadados num ano com despesas autorizadas em anos anteriores.Neste ano, o investimento recorde de R$ 19,2 bilhões com dinheiro dos tributos embutiu o pagamento de R$ 10,5 bilhões de contas pendentes de investimentos autorizados em outros anos. E, ainda assim, restou um saldo de R$ 5,4 bilhões de contas não quitadas de 2006, que também vão pressionar a execução do Orçamento deste ano.Nos dois últimos relatórios aprovados pelo TCU, houve críticas ao volume crescente dos restos a pagar, considerado "preocupante". Para o Tesouro, a prática é "rotineira" porque o governo não consegue cumprir todas as etapas dos gastos no mesmo ano em que as despesas foram autorizadas por lei.

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