segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Senado quer convocar general que admite prisões na Operação Condor

Por Luciana Nunes Leal e Roldão Arruda
no Estado de São Paulo

A Comissão de Direitos Humanos do Senado quer retomar os trabalhos legislativos, em fevereiro, com uma audiência pública para discutir a participação de militares brasileiros na Operação Condor, nome dado às ações conjuntas das ditaduras da América do Sul, nas décadas de 70 e 80. Integrante da comissão, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) defendeu ontem que seja chamado o general da reserva Agnaldo Del Nero Augusto. Em entrevista ao Estado, ele revelou que o Exército brasileiro prendeu militantes latino-americanos e os entregou a militares argentinos.O senador ficou indignado com as declarações de Del Nero sobre a participação brasileira na operação: “Que ele venha a público dizer isso. O que se fez foi entregar pessoas para a morte. Acabo de ver a história de um caminhão que enchiam de judeus, na Alemanha, e funcionava como uma câmara de gás. E o motorista disse que só dirigia.” Para Cristovam, a declaração do general “é de mau gosto, cínica e desrespeitosa”.Del Nero, que integrou a Seção de Informação do Estado-Maior do 2º Exército, nos anos 70, disse ao Estado que os militantes de esquerda eram apenas presos no Brasil: “A gente não matava. Prendia e entregava. Não há crime nisso.”“Há crime, sim”, reagiu o ex-deputado e advogado de presos políticos Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP). “Ele acha que está isento de culpa, mas não está. Se o Exército de outro país matou, o Exército brasileiro concorreu para a prática do crime. Além disso, foram ações totalmente clandestinas e ilegais e, portanto, criminosas.”As declarações do general Del Nero repercutiram intensamente entre militantes da área de direitos humanos. Em Porto Alegre, o fundador do Movimento Justiça e Direitos Humanos, Jair Krischke, destacou que até hoje nenhuma autoridade militar tinha falado abertamente sobre o assunto: “São revelações importantes. Abrem uma fresta, pela qual começamos a visualizar com mais clareza o que aconteceu nos anos da ditadura - especialmente a colaboração das Forças Armadas com suas congêneres de países vizinhos, na Operação Condor.”Krischke, que assessora a Justiça da Itália na investigação dos crimes contra cidadãos de origem italiana, disse que o general confirmou o que os movimentos de direitos humanos já sabiam: “A diferença é que agora temos a declaração de um general, alguém que teve um posto importante no esquema repressivo.”O advogado Fermino Fecchio, ouvidor nacional da Secretaria Especial de Direitos Humanos, também considerou relevante o relato do general: “É uma voz do lado de lá que admite o que todo mundo já sabe. Agora não há mais como esconder.”Fecchio, que nos anos 70 ajudou a denunciar as atividades da Operação Condor, espera que as declarações do general possibilitem novas revelações: “Por que não revelar toda a história? Não se trata de revanchismo, mas sim de conhecer melhor a história do País e fortalecer a democracia.”

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