domingo, 5 de outubro de 2008

Ninguém quis se mostrar como oposição ao presidente

Por Christiane Samarco
no Estado de São Paulo

Revogaram a oposição no Brasil. É o que afirmam líderes e presidentes de partidos aliados e de oposição que percorreram grandes metrópoles e pequenas cidades do interior do País ao longo dos 60 dias de campanha que antecederam a eleição de hoje. Em tempos de popularidade recorde do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (69% de bom e ótimo na pesquisa CNI-Ibope do dia 29) e de temor do eleitorado em eleger um adversário do governador para dirigir sua cidade, oposicionistas de Norte a Sul adotaram o discurso da "parceria administrativa" com o governo estadual e do diálogo com o Planalto, entremeado de elogios a Lula. "Este é um fenômeno totalmente novo no País", atesta o deputado Jutahy Júnior (PSDB-BA), que percorreu 70 dos 417 municípios baianos e não encontrou em nenhum deles "uma só alma esbravejando" contra o governo."O fenômeno é tão novo que, às vezes, não sei se estou fazendo campanha na Croácia ou no Brasil", ironiza bem-humorado o deputado Alceni Guerra (DEM-PR). O deputado do DEM e o tucano não têm dúvida de que os adversários do Palácio do Planalto e dos governadores não encontraram palanque nem espaço político para fazer oposição na disputa municipal."É o caos político: ficamos sem discurso, sem dinheiro de emendas parlamentares para financiar obras em prefeituras comandadas por aliados e sem espaço para uma fala oposicionista porque a população está satisfeita com o status quo", resume Alceni. Ele lembra dos "bons tempos" da oposição no passado, quando os petistas sempre "faturavam" com a fatia da população que estava insatisfeita com o governo, e conclui: "Hoje não há nada o que faturar porque não há oposição popular ao governo federal."
NICHO
Ao contrário, aliados e adversários do Palácio do Planalto admitem, sem titubear, que candidatos de todos os partidos Brasil afora são só elogios a Lula. "Inclusive nós, do DEM", reconhece Alceni. Em busca um nicho para se aproximar do povo mais simples e feliz com o governo federal, em suas andanças pelo interior do Paraná, o democrata confessa que faz "elogios rasgados" ao presidente.A tática do deputado para ser ouvido é falar do homem simples que migrou do Nordeste para São Paulo e hoje comanda o País, a partir de uma analogia entre as populações paulista e paranaense, ambas formadas por grandes contingentes de migrantes. Na busca de traços comuns entre sua história e a do presidente, recorda os avós que deixaram o Rio Grande Sul de caminhão, como os Silva partiram de Garanhuns.O senador Delcídio Amaral (PT-MS) testemunha que o fenômeno da ausência de oposição na campanha municipal também tomou conta de Mato Grosso do Sul. Ele acredita que muitos adversários gostariam de falar mal, mas não o fazem porque sabem que perderiam votos.
PATRIMÔNIO
"Na eleição passada, o Lula era tratado como a praga da agricultura no Centro-Oeste, mas hoje ninguém ousa levantar a voz contra ele no palanque. Ninguém é doido de bater de frente com o Lula", destaca Delcídio. Para o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), Lula não é mais patrimônio do PT e das forças de esquerda, mas de toda a aliança. "Em todo canto do País tem fotografias do candidato a prefeito e seu vice ao lado do governador e do presidente Lula." E de certa forma, raciocina, o exagero beneficiou a oposição.Guerra está convencido de que os aliados do Planalto "vulgarizaram a imagem do homem de barba" a tal ponto que o chamado "fator Lula" até agora não produziu o efeito esperado na campanha. "São Paulo e Rio são a prova de que a presença de Lula na campanha não foi suficiente para alavancar seus candidatos", diz. "Banalizaram demais o apoio de Lula e pagaram o preço.""A oposição sumiu da campanha por puro oportunismo eleitoral e isso é até ruim para a democracia", critica o líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE). O líder avalia que o oportunismo está privando o debate democrático do contraponto. A seu ver, a oposição não está perdida apenas diante da popularidade inédita de Lula, mas porque o projeto do PT começa a ter "posição hegemônica" na sociedade. "Há uma aceitação incontestável do nosso projeto e eles não contestam porque seria suicídio eleitoral, mas a oposição sabe que a proposta dela é outra", alfineta o petista. Mas os tucanos contestam Rands. Dizem que o grande mérito de Lula foi ter mantido o plano econômico do governo Fernando Henrique Cardoso, a partir da escolha de um tucano para comandar o Banco Central."Quando uma coisa está dando certo, todo mundo se apropria. Com o Plano Real foi assim", recorda o senador, ao lembrar que o PT também acabou se rendendo ao sucesso do plano de estabilização do governo tucano. "Se o processo está dando certo, fazer oposição é remar contra a maré", conclui.

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