sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Brasil cancela missão técnica ao Equador

Por Eliana Cantanhêde
na Folha de São Paulo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva irritou-se com a decisão anunciada anteontem pelo governo do Equador de expulsar a construtora Norberto Odebrecht do país e mandou cancelar a ida de uma missão técnica no próximo dia 15 para discutir o apoio a obras de infra-estrutura no país.O principal tema da reunião seria um projeto de profundo interesse do Equador: o Manta-Manaus, para ligar a cidade portuária equatoriana à capital do Amazonas com estradas, pontes, portos e vias fluviais."Em face dos últimos desdobramentos envolvendo empresas brasileiras naquele país (...), o governo brasileiro decidiu postergar sine die [sem data] a ida ao Equador de uma missão chefiada pelo ministro dos Transportes [Alfredo Nascimento]", diz nota do Itamaraty.No texto, o governo reclama ainda que esses "desdobramentos" -ou seja, a expulsão da construtora- "contrastam com as expectativas de uma solução favorável quando do recente encontro entre os dois presidentes [Lula e Rafael Correa] em Manaus".Foi o primeiro ato de retaliação do governo brasileiro a Correa, que no dia 23 de setembro editou decreto embargando os bens da Odebrecht, acusada de falhas na construção de uma hidrelétrica. Depois, ele ameaçou expulsar a empresa do país e não pagar dívida com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) de US$ 243 milhões relativa ao financiamento da construção da usina.A gota d'água, conforme a Folha apurou, foi que Correa tinha acertado com Lula no dia 30 de setembro, em Manaus, que recuaria da ameaça de expulsão da Odebrecht para reabrir as negociações com a empresa e facilitar o diálogo governo a governo. Lula foi surpreendido com o anúncio equatoriano ratificando a expulsão.
Conversa em Manaus
Na conversa em Manaus, Lula tinha pedido a retirada do decreto para "desanuviar o ambiente" e disse que, em contrapartida, mandaria a missão técnica a Quito. Correa aceitou, apesar de fazer sérias críticas às empresas brasileiras, insinuando que não respeitavam as regras locais e ofereciam propinas a funcionários públicos.Ele deixou implícito que não poderia recuar naquele momento, porque o referendo para ratificar a nova Constituição do Equador tinha ocorrido dois dias antes e ficaria parecendo que ele só tinha comprado a briga com a Odebrecht para angariar votos. Mas assumiu o compromisso de abrandar o tom e retomar as negociações.Lula saiu do encontro imaginando que a revogação do decreto seria anunciada uma semana depois, inclusive liberando os dois brasileiros que estão refugiados na residência do embaixador para sair do país.Apesar da gravidade das medidas tomadas por Correa em setembro, Lula se dizia tranqüilo, porque fora informado pelo Itamaraty e por sua assessoria internacional de que o presidente agia assim por "questões políticas internas".Referiam-se ao referendo equatoriano do dia 28 para ratificar a Constituição do país, feita ao gosto do novo governo. "Falar grosso" com o Brasil seria parte da campanha. Com o anúncio da expulsão, Lula, o Itamaraty e a assessoria da Presidência finalmente descobriram que Correa não blefava.A usina de San Francisco, pivô da crise, é responsável por 12% da produção energética do Equador. Ela parou de funcionar em 6 de junho deste ano, com o desabamento de parte do túnel de distribuição de água e desgaste das turbinas. O governo culpou a Odebrecht, que atribui os problemas à erupção de um vulcão.Correa também quer rever o contrato com a Petrobras de exploração do bloco 18, para que toda a extração fique com o país. Sem acordo, o presidente ameaça expulsar a empresa. O Brasil disse que exigirá indenização pelos investimentos.

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