quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Peleguismo ressurrecto

Editorial do Estado de São Paulo

Foi tamanha a intensidade com que o lobby sindicalista avançou e “tomou conta” do Senado, na quinta-feira, para manter a cobrança compulsória do imposto sindical - que havia sido derrubada na Câmara dos Deputados, por emenda do deputado Augusto Carvalho (PPS-DF), no bojo do Projeto de Lei 1990/07, que regulamenta as centrais sindicais -, que o senador Paulo Paim (PT-RS), relator do projeto na Comissão de Assuntos Sociais, cometeu o ato falho de chamar aquela reunião de “assembléia” (como se estivesse numa assembléia sindical), quando bradou: “Não vamos aceitar uma única vírgula que prejudique a organização dos trabalhadores.” Certamente o senador gaúcho aí se esqueceu de que seu partido, além das principais centrais sindicais - a CUT e a Força Sindical -, sempre usou carradas de vírgulas para condenar a “contribuição” que tunga um dia de salário por ano de cada trabalhador, mesmo contra sua vontade. Os outros dois relatores - Lucia Vânia (PSDB-GO), da Comissão de Constituição e Justiça, e Francisco Dornelles, da Comissão de Assuntos Econômicos - também prometeram fazer um relatório conjunto e “em defesa dos trabalhadores”, ressuscitando a obrigatoriedade da cobrança do imposto sindical. Nas mais de três horas de debate sobre o projeto que extingue a obrigatoriedade do imposto sindical, os sindicalistas lotaram o auditório Petrônio Portela, do Senado, e fizeram um lobby aberto, como nunca se vira na Câmara Alta, para reverter a decisão da Câmara dos Deputados.Como não poderia deixar de ser, os líderes das principais centrais sindicais - que não se conformam em perder a “boquinha” que só no próximo ano lhes renderá R$ 125 milhões, se o imposto sindical for ressuscitado - foram os mais enfáticos defensores de suas rendas.A representante da CUT, sua secretária nacional de organização, Denise Motta Dau, apesar de defender posição contrária à histórica da entidade e propugnar a manutenção do imposto, até que demonstrou mais ponderação e equilíbrio em suas palavras, limitando-se a dizer que “retirar a contribuição sem que haja um período de transição é acabar com os sindicatos” (é claro que não explicou se esse período de transição deveria ser de 1 ou de 100 anos). O presidente da UGT, Francisco Canindé Pegado, não revelou muito respeito à representatividade da Casa Legislativa, quando afirmou: “Não tenho dúvidas de que nós vamos impor aqui no Senado a derrubada da emenda” (grifo nosso). Mas foi o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), que tem desempenhado, nos últimos dias, o lobismo mais intenso para derrubar no Senado o fim do imposto sindical obrigatório, o que usou verdadeiro terrorismo em defesa da contribuição, falando despropósitos do tipo: “Querem tirar da gente as conquistas que muitos de nós morreram defendendo”, e insinuando que o fim da obrigatoriedade do imposto sindical pode significar também o fim das férias ou o da licença-maternidade! É lamentável que um sindicalista, tendo se tornado representante com mandato popular perante a Casa Legislativa federal, tenha adquirido um dos piores vícios da classe política cabocla, que é a demagogia desbragada, que parece zombar da inteligência do distinto público eleitoral. Aliás, numa demonstração do “espírito democrático” daquela “assembléia” síndico-legislativa, os circunstantes reagiram com vaias e gritos de “traidor”, de “farsante”, de “inimigo do trabalhador” contra o único parlamentar que, junto com 20 servidores federais, ali estava para apoiar a emenda que derrogara o imposto sindical obrigatório - o mesmo deputado Augusto Carvalho. Completamente avessos a qualquer diálogo, os sindicalistas tentaram, mas não conseguiram calar o deputado, que dizia, convicto: “Esse imposto é ilegítimo. Os sindicalistas precisam dele para meter a mão no bolso do trabalhador. O imposto é uma excrescência.”Como efeito, não será, mesmo, uma excrescência, essa herança tipicamente peleguista do Estado Novo? Numa coisa, porém, os sindicalistas têm razão: não tem sentido acabar-se apenas com a contribuição obrigatória dos empregados, mantendo-se a contribuição obrigatória dos patrões. As duas obrigatoriedades são excrescências.

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