quinta-feira, 30 de outubro de 2008

FMI abre crédito de US$ 100 bi a emergentes

Por Fernando Rodrigues
na Folha de São Paulo

Depois de várias semanas de séria crise financeira mundial, o FMI (Fundo Monetário Internacional) finalmente se mexeu e anunciou ontem a criação de uma linha de crédito de curto prazo para países emergentes, inclusive o Brasil, no valor total de US$ 100 bilhões. "Esse valor pode ser aumentado se for necessário, disse Dominique Strauss-Kahn, diretor-gerente da entidade, em entrevista no final da tarde na capital dos Estados Unidos.O instrumento foi batizado de SLF, sigla a partir do nome em inglês ("Short-Term Liquidity Facility", ou Linha de Liquidez de Curto Prazo). A idéia é ajudar emergentes que estejam sofrendo por causa da atual crise financeira internacional.O dinheiro ficará disponível por um curtíssimo prazo para o país tomador -apenas três meses. Haverá a possibilidade de rolagem do empréstimo só por duas vezes, também por períodos de 90 dias. Ou seja, no máximo será um dinheiro para fluxo de caixa por nove meses para quem estiver interessado.As taxas de juros aplicáveis sobre o dinheiro sacado vão depender do valor que cada país retirar. Variam de 2,9% a 4,9% por um período de três meses.Trata-se de uma ação inédita na história do FMI. O dinheiro ficará disponível imediatamente para os países que se candidatarem ao crédito e estiverem habilitados a recebê-lo. Até hoje, desde a sua criação em 1944, o Fundo só deu dinheiro para países depois de ampla fiscalização das contas e quando o governo tomador aceitava assinar uma carta de intenções.Desta vez será um instrumento "fácil de usar, muito rápido", completou John Lipsky, primeiro vice-diretor-gerente do FMI. "Vários países" já teriam demonstrado interesse, disse Strauss-Kahn, sem especificar. "Será necessário esperar 24 horas a partir do anúncio para que saibamos exatamente quantos se interessarão."Nem todos poderão sacar. A consulta será confidencial, e o FMI vai deliberar rapidamente com base em dois itens. Primeiro: a sustentabilidade recente das dívidas externa e interna do país interessado. Segundo: as contas públicas do país, como política fiscal e inflação controlada, entre outros aspectos.Durante o anúncio, Strauss-Kahn foi indagado sobre se a Argentina teria condições de se candidatar ao dinheiro. O diretor-gerente do FMI não quis responder de maneira direta, mas disse que um país sem um bom histórico econômico "não seria elegível". Aos olhos do Fundo, a Argentina não se encaixa nessa qualificação e será uma exceção se o país for aceito nesse novo programa.Não é o caso do Brasil, que desde dezembro de 2005 liquidou todos os compromissos com o FMI e nada mais deve à entidade. Se desejasse ter acesso ao dinheiro, o governo do presidente Lula teria condições de receber até o máximo de US$ 22,5 bilhões a uma taxa de 4,9% por três meses.O limite da nova linha de crédito a que cada país terá acesso está relacionado ao tamanho da cota que cada um tem no FMI. Todos os 184 países-membros entram para o Fundo mediante o pagamento de parcela em dinheiro. No caso do Brasil, a cota é de 3 bilhões de SDRs (direitos especiais de saque), cujo valor equivalente é de aproximadamente US$ 4,5 bilhões."Cada país poderá sacar até o máximo de 500% da sua cota", explicou Strauss-Kahn. Ou seja, no caso brasileiro, US$ 22,5 bilhões. Para países que optarem por um valor até 200% da cota, a taxa de juros cobrada será bem camarada: 2,9% por 90 dias. Ou seja, é realmente uma facilidade para ajudar os governos que estiverem em dificuldade na atual crise.O valor total de US$ 100 bilhões a ser colocado à disposição para essa linha de liquidez de curto prazo teve como base as atuais reservas do FMI, na casa dos US$ 200 bilhões. "A diretoria fixou em 50% das nossas reservas a disponibilidade para a SLF", declarou Strauss-Kahn, respondendo a uma pergunta da Folha.Indagado então se esse valor não parecia pequeno dada a natureza da crise e o tamanho de certas economias que poderiam usar o dinheiro -foi citado o Brasil, cujas reservas estavam até pouco tempo na casa dos US$ 200 bilhões-, o diretor-gerente do FMI concordou. "De fato, esse é um valor que terá de ser complementado por outras fontes. Mas é bom que o Fundo possa estar ajudando seus membros no curto prazo sem muitas precondições."Essa decisão do FMI é uma tentativa de resposta às críticas que a entidade vem recebendo nos últimos anos pela sua incapacidade de coordenação da economia mundial e pela demora em reagir à atual crise, que também pegou a instituição despreparada.

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