sábado, 26 de janeiro de 2008

Seringueiros relatam que bolivianos os expulsaram

Por Matheus Pichonelli
na Folha de São Paulo

Seringueiros brasileiros que vivem às margens do rio Mamu, no departamento de Pando, na Bolívia, próximo à fronteira com o Brasil, relatam que uma milícia armada está agindo na região e pressionando as famílias a deixarem o local.A situação foi relatada, na última quarta-feira, por um grupo de 80 seringueiros a autoridades brasileiras e bolivianas durante reunião realizada numa escola de Vila Extrema, distrito de Porto Velho (RO), localizado a 360 quilômetros do centro da capital. A facção, segundo os seringueiros, é composta por mais de 30 homens.Participaram do encontro o vice-cônsul do Brasil em Cobija, Júlio Miguel da Silva, militares e políticos dos dois países.No encontro, os seringueiros afirmaram que receberam, no início de janeiro, uma espécie de intimação, feita por homens armados que percorrem a região com rifles e escopetas, para deixarem suas propriedades. Contaram não terem tido tempo de recolher seus pertences.Segundo eles, algumas famílias de brasileiros estão "reféns" da suposta milícia, que não permite que ninguém entre ou saia da região.Leonardo Fragoso, 68, seringueiro que vive há 42 anos com a mulher e dois filhos -nascidos naquele país- em uma propriedade não regularizada na Bolívia, disse à Folha que veio passar o fim de ano com a família no Brasil e que, na volta, foi abordado por um grupo armado com espingardas que não o deixou seguir caminho. A família dele tinha ficado no Brasil."Estavam numa ponte e não deixaram a gente passar. Ficamos quatro dias presos no barco e, depois disso, mandaram a gente voltar para o Brasil."Durante os quatro dias, cerca de 30 pessoas que estavam no barco com Fragoso se alimentaram das mercadorias compradas no Brasil.Segundo ele, não houve disparos nem agressão. Apenas ameaças. "Soube depois que uns 12 bolivianos tinham entrado na casa de uns parceiros no seringal perto do meu e mandaram saírem de lá com a arma no lombo", disse.Fragoso, que é dono de um seringal chamado Primavera, às margens do rio Mamu, afirma que o grupo tem como objetivo tomar a produção de castanha quebrada em seu seringal durante a última safra -algo em torno de 180 mil quilos do produto, segundo ele.Fragoso, que estimava ganhar R$ 70 mil com a produção, diz que os bolivianos ficaram também com 18 animais de carga da propriedade. "Falaram que nada mais ali é meu."O seringueiro diz que não quer mais viver na Bolívia. "Não vou ficar num lugar onde sou perseguido. Tudo o que quero agora é torcer para que os países entrem em acordo e que eu consiga pegar pelo menos meu gado e minhas galinhas pra começar a vida aqui."Segundo o professor de história Francisco Marquelino Santana, 41, que mora em Vila Extrema, cerca de 80 famílias brasileiras vivem às margens do rio Mamu. A maioria mora em pequenas propriedades, trabalham com extração de madeira, borracha e castanha. A Constituição boliviana proíbe a aquisição, por estrangeiros, de terrenos numa faixa de 50 quilômetros da fronteira.

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