terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Mercado reavalia preços em dia de pânico

Por Toni Sciarretta
na Folha de São Paulo

Os mercados globais viveram ontem um dia de pânico. As principais Bolsas da Ásia, da Europa e das Américas desabaram por conta do pessimismo de que uma recessão nos Estados Unidos contamine todas as economias do planeta, preocupação que até o ano passado era atenuada pelo forte crescimento da China e de demais países emergentes.Com o mercado americano fechado devido ao feriado de Martin Luther King, os investidores perderam ainda mais a referência dos negócios. Na dúvida, preferiram vender ontem ações, commodities, títulos e moedas de maior risco a apostar em uma melhora que pode não se confirmar nos próximos dias. Desde a sexta-feira, os mercados recuam por conta da decepção com o pacote de corte nos impostos nos EUA. A visão é que terá pouca força para evitar uma recessão no país.Na Ásia, a Bolsa de Xangai caiu 5,14%, enquanto a de Hong Kong recuou 5,49%. Em Tóquio, a baixa foi de 3,86%, a maior em dois anos. Na Europa, as perdas foram as maiores em um único dia desde os atentados de 11 de Setembro: 7,16% em Frankfurt, 6,83% em Paris e 5,48% em Londres. Nas Américas, a Bovespa recuou 6,6% e voltou a 53.709 pontos, também uma das piores baixas desde o 11 de Setembro. No México, a baixa foi de 5,35%, e, em Buenos Aires, de 6,27%. Para hoje, é forte a expectativa em torno da abertura das Bolsas americanas. Se abrirem em forte baixa, podem alimentar uma nova rodada de venda de papéis nos mercados.Anunciada em diversos momentos de 2007, a crise nos mercados globais dá sinais de que chegou e de que pode demorar a passar. Para economistas, a derrocada ontem está ligada a um recálculo geral de preços com base em uma nova realidade: a de um mundo em desaceleração econômica, que consome menos.O motor da desaceleração é o crédito menor nos EUA. Como os bancos tiveram de reconhecer perdas contábeis, diminuiu o montante que estavam autorizados a emprestar. Para não ficar com o nível de crédito acima de suas possibilidades, emprestam menos e ainda precisaram de injeção de capital de fundos de países do Oriente Médio e da Ásia. Sem crédito, o americano consome menos, e os empresários seguram os investimentos. Um dos resultados é o aumento do desemprego, que acontece desde dezembro. Nos EUA, 70% do PIB vem do consumo. É dessa forma que a crise no sistema financeiro chega ao resto da economia e afeta outros setores.Com as economias cada vez mais interligadas, a desaceleração americana traz menor demanda por produtos chineses, europeus e do restante do mundo. A demanda menor dever derrubar preços de commodities, em sua maioria de países emergentes como o Brasil.Para o professor Marcio Holland, da FGV (Fundação Getulio Vargas), a economia americana deve viver um ano de forte ajuste em 2008, com reflexos se estendendo até em 2009. "A crise do "subprime" [hipotecas de alto risco] é apenas a "ponta do iceberg". O mercado de crédito deve sentir grandes correções, que implicam redução de liquidez. A Europa não ocupa o lugar dos EUA nas finanças internacionais nem a China tem sistema financeiro desenvolvido para isso.""O que está acontecendo é o reflexo dessa crise que vem se arrastando desde agosto do ano passado. Na virada de ano, os bancos tiveram de reconhecer o prejuízo de 2007. Menos crédito significa menos consumo e lucros menores. Há uma expectativa de reavaliação completa nos preços da economia", afirmou Alexandre Jorge Chaia, professor de avaliação de riscos do Ibmec-SP.
Fator China
Até o ano passado, a China era vista como motor capaz de segurar a demanda mundial em caso de desaceleração nos EUA. Nos últimos dias, porém, começaram também especulações sobre o grau de exposição dos bancos chineses aos títulos ruins do mercado imobiliário americano. Mesmo as exportações chinesas começam a desacelerar para os EUA. Tudo isso pode levar a um estouro no otimismo com a Bolsa de Xangai, que subiu 96,14% em 2007."Não dá para dizer que esse cenário [negativo] é definitivo. Só vai saber se veio para ficar se a China for contaminada também", disse Marcelo Ribeiro, da Pentágono Asset.

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