domingo, 27 de janeiro de 2008

Por que não anda

Por Afonso Lopes
no Jornal Opção

Há alguma coisa errada com a reforma administrativa do governador Alcides Rodrigues. Ou o rombo não era lá essa coisa toda, de 100 milhões de reais por mês, ou o governo está em estado de choque, sem capacidade administrativa para reagir. Como se fosse um paciente terminal que, depois de todos os esforços da medicina, entregou os pontos. Não é possível analisar o que está aí fora dessas óticas. Ou o rombo é tão grande que não há mais o que fazer senão esperar pelo pior, ou esses 100 milhões talvez já não sejam assim uma Brastempona tão grande. Acredito que as contas do Estado estejam muito mais equilibradas, ao ponto de o governo agora apontar não para uma brutal redução do tamanho da máquina, como se previa inicialmente, mas para uma reorganização interna. Claro que com diminuição nos custos, mas sem tanto radicalismo como era de se esperar. A realidade é que o Estado está andando num ritmo extremamente lento. Faz-se, sim, alguma coisa, mas longe de o pé estar atolado no acelerador. Os programas sociais, por exemplo, principalmente o mais caro deles, o Renda Cidadã, está suspenso há mais de um ano. É economia pra dar com pau. Os salários dos servidores, eterna fonte de preocupação em todas as esferas administrativas do Brasil, pararam de avançar de forma rápida sobre o orçamento. Há crescimento nos valores, mas em patamares que não assustam tanto quanto já assustaram. Em muitas outras áreas, o Estado parou quase totalmente. Um retrato dessa situação difícil surgiu através do secretário da Saúde, Cairo de Freitas. Publicamente, ele protestou contra concentração de poderes na Secretaria da Fazenda. Usou como escada para o holofote a incorporação de uma tal de Escola de Saúde. Pouca gente, talvez ninguém entre os cidadãos que se espremem dolorosamente nas imensas filas dos hospitais públicos de Goiás, sabia que a tal escola existia. Nos bastidores, principalmente entre jornalistas com anos de experiência na cobertura palaciana, essa versão não foi totalmente digerida. Há algo maior por trás do protesto do secretário. Cairo pode ter mirado na escola para acertar no alvo que realmente interessa, que a pouquíssima verba que ele julga receber de Jorcelino Braga para administrar o seu setor. E aqui entra uma outra questão: ou o dinheiro é realmente muito curto, ou há incompetência na gestão da saúde. Não se trata mais de culpar esta ou aquela estrutura pelo autêntico e inquestionável caos que a Saúde pública estadual está vivendo. Antes, culpou-se os prefeitos por não investirem nas unidades básicas, o que sobrecarrega as grandes unidades. Isso também agrava a situação geral, mas não é o único fator. O hospital de urgências de Aparecida de Goiânia é a prova incontestável de que há má gerência ou total falta de dinheiro. E não há dúvida de que prefeito algum tem qualquer parcela de culpa em relação a isso. Não é só. O jornal O Popular fez uma série de reportagens revelando boa parte dos problemas da Saúde. Uma parte apenas. Se for mais fundo, a realidade que surgirá será muito pior. Faltam médicos em quase todas as áreas. Há equipamentos instalados em algumas unidades que só funcionam parte do expediente, como se a doença também atuasse somente meio período. Aparentemente, o grande problema do Hugo, maior hospital de urgências do Centro-Oeste brasileiro, é a falta de leitos. Não é. Esse é apenas um dos problemas sérios do Hugo. O Popular mostrou que o Hugo se transformou numa fábrica de infecção. E aqui, mais uma vez, cabe ressaltar a dúvida: ou é falta de dinheiro ou de competência de gestão. Infecção hospitalar não tem tanta ligação assim com a super-lotação. No ano passado, por exemplo, o serviço terceirizado de limpeza do Hugo parou. A empresa reclamava pagamentos atrasados. Hospital sujo e mal cuidado faz disparar bactérias e vírus pelos corredores. E a infecção hospitalar é um absurdo total. O sujeito entra no hospital para se ver livre de um mal e sai de lá pior do que entrou. Cairo reclamou da incorporação da tal escola pela Secretaria da Fazenda. Ora, ou o doutor secretário ficou doido de vez, ou cabe aqui a tal tese do tiro em outra mira. Quer dizer que tem gente morrendo porque os hospitais goianos estão um caos absoluto e o secretário do setor se preocupa com o aprendizado do ABC da saúde? Isso não faz nenhum sentido lógico. O episódio protagonizado pelo secretário da Saúde é emblemático. Representa a angústia que se vive dentro do governo. E há de tudo um pouco dentro desse governo. Principalmente, má vontade de gestão por parte da maioria esmagadora dos secretários e demais dirigentes. Basta anunciar uma mudança que represente perda pessoal de espaço e lobbys aparecem instantaneamente. Foi assim em cada uma das áreas a serem incorporadas ou extintas. Fapeg vai passar a ser uma superintendência? Lobby do setor contra a medida. As inúmeras super-posições da Agricultura será um pouquinho menor com a extinção de uma agência? Mais lobby ainda, incluindo até o setor empresarial. E assim vai até o final da lista. Inclusive com movimentação de mídia oportunista. Secretaria de Comércio Exterior será extinta e transformada em superintendência? Dá-lhe notícias sobre recordes de exportação. E quem disse que o Estado precisa ter 50 ou 60 cargos de primeiro escalão para poder exportar, incentivar e proteger a produção rural ou melhorar a saúde pública? Não precisa. Aliás, o melhor seria o inverso. Goiás funcionaria maravilhosamente bem com uma dúzia, se não menos, de secretarias. O objetivo prático da existência desses cargos todos é político, não é administrativo. Para não ficar em Goiás, outro exemplo que confirma essa tese está no governo Lula. O presidente criou tantos Ministérios e Secretarias com o mesmo status, que a maioria deles ninguém sabe que existe. Como no caso da tal escola da saúde. Não que aqui se esteja defendendo a extinção da escola. Não é isso. O que importa é que ela funcione, esteja ela ligada a esta ou aquela secretaria. Não importa se quem administra é o padre, o bispo ou o pastor. O que interessa é ir para o Céu.

Nenhum comentário: