quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Lula diz que devastação é 'alarde' e cobra investigação dos dados do Inpe

Por Rui Nogueira, José Maria Tomazela e Clarissa Oliveira
no Estado de São Paulo

Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizia em Brasília que houve 'alarde' na divulgação dos números do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) sobre desmatamento na Amazônia e que eles estão 'sob investigação', a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmava em Sinop (MT) que os dados mostrando aumento na devastação estão corretos.
Sem citar a ministra, Lula criticou o Ministério do Meio Ambiente e ONGs, afirmando que não se pode culpar a agropecuária, os produtores de soja e os sem-terra assentados pelo aumento do desmatamento. 'Não dá para culpar ninguém', afirmou ontem ao final de um almoço no Itamaraty. Na semana passada, Marina atribuiu a produtores rurais parte da responsabilidade do avanço do desmate - 3.233 km2 devastados nos últimos cinco meses de 2007. Ontem, Lula comparou a divulgação dos dados a um procedimento médico que, 'sem fazer a biópsia, encara um sinal na pele como se fosse câncer'. 'Você vai ao médico, você está com um tumorzinho e, em vez de fazer biópsia e saber como vai se tratar, já sai dizendo que tem câncer!' Mais tarde, em São Paulo, Lula disse que 'é como se você tivesse uma coceira e achasse que é uma doença grave'.Já Marina, em viagem a Sinop, após sobrevoar áreas desmatadas, defendeu o sistema Deter (que detecta desmatamentos em tempo real). 'Até agora as informações têm sido acertadas.' Segundo ela, 'o Deter sinaliza indícios de desmatamento' para que seja possível agir preventivamente. Lula disse ter pedido a Marina Silva que convide os governadores para reunião em Brasília, mas ainda sem data definida. Também mobilizou os ministérios do Meio Ambiente, Agricultura e Justiça para que visitem os locais com altos índices de desmatamento.A ministra esteve ontem com o governador de Mato Grosso, Blairo Maggi (PR), produtor de soja e aliado do governo federal. Ele cobrou explicações sobre os números - o Estado aparece em 1º no ranking das cidades que mais devastaram. Em meio a uma entrevista da ministra, Maggi interrompeu-a para dizer que 'os dados de abril a setembro não estão corretos'. 'Preciso falar agora, senão vou ficar com o chapéu na mão', justificou. O governador disse à ministra que o próprio presidente do Inpe, Gilberto Câmara, reconheceu o erro.Reportagem publicada no domingo pelo Estado mostrou que os dados divulgados pelo Inpe em outubro estavam errados. Eles mostravam que a taxa de derrubada da floresta havia aumentado 8% nos meses de junho a setembro em comparação com mesmo período de 2006. Com relação somente a setembro, por exemplo, a estimativa foi reduzida de 1.424 km2 para 632 km2 desmatados - diferença de 55%. Os números foram revisados, segundo o diretor do Inpe, e corrigidos antes da divulgação da semana passada.Para Lula, o fato de que houve um aumento do desmatamento no último trimestre do ano passado não quer dizer que na conta do ano inteiro o desmatamento cresça. 'A questão é que a Amazônia não permite descuido', disse. Com base na área de 3.233 km2 devastados detectada pelo Deter, o Inpe projetou o desmatamento em cerca de 7 mil km2 no período. 'É preciso investigar. Mas todos que promoveram queimadas ilegais devem receber um duro processo, perder a propriedade', afirmou Lula. Ele disse ainda que 'vai comprar briga' com as ONGs se insistirem em ligar o crescimento da agricultura ao desmatamento. Para ele, os dados do IBGE mostram que a soja cresce 'sem precisar derrubar árvores'.Segundo Marina Silva, o que motivou a divulgação dos números na semana passada foi exatamente a informação de que a área desmatada em 2007 pode chegar aos 7 mil km2. 'É uma forma de alerta. O desmatamento caiu de 2005 para cá. Se perdemos essa batalha, será ruim para todos.'À tarde, em São Paulo, Lula admitiu que parte da tendência de alta do desmatamento pode estar relacionada a uma dificuldade do Ibama de realizar a fiscalização na Amazônia. 'É bem possível. Por isso acho que não cabe só ao Ibama fazer toda a fiscalização', disse. Ele destacou que o governo realizou um concurso para ampliar os quadros do órgão.
VISITA
Marina Silva voou por cerca de 1 hora a partir de Marcelândia, mais ao norte de Mato Grosso, na companhia dos ministros Tarso Genro (Justiça) e Guilherme Cassel (Desenvolvimento Agrário). O governador Blairo Maggi juntou-se à comitiva em Marcelândia. A ministra não comentou a afirmação de Maggi de que a divulgação dos números pode ter sido causada por disputa por verbas. 'Neste momento, não adianta essa discussão.'

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