terça-feira, 30 de setembro de 2008

''República da polícia'' vira cruzada de Mendes

Por Fausto Macedo
no Estado de São Paulo

O ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), voltou a advertir ontem, após conferência em São Paulo sobre os 20 anos da Constituição, para os riscos do que chamou de "república da polícia, república do juiz, do promotor". Em sua cruzada contra abusos de investigações patrocinadas por órgãos oficiais sob o manto do combate ao crime organizado e à corrupção, ele incluiu em seu libelo excessos e desobediências de comissões parlamentares de inquérito."Já tivemos exemplos em que havia um consórcio entre Ministério Público e um dado juiz e a partir daí se imaginava que se tinha fundado uma república. Vivemos isso em algum momento. Agora, em tempos mais recentes, temos vivido um tipo de república da polícia e também, às vezes, o consórcio com juiz e promotor."Mendes reiterou a necessidade de enfrentar a "ditadura do grampo telefônico". "Aqui talvez seja um processo de devido controle dos principais setores envolvidos, seja o próprio Judiciário, o próprio Ministério Público, mas aí são dissintonias que não têm nenhum significado no sistema macro estrutural da Constituição. São questões que podem ser corrigidas sem nenhuma alteração constitucional. Uma mera alteração legislativa, às vezes, ou uma mera reinterpretação por parte do Judiciário já pode fazer essas correções." Ele condenou "tribunais de exceção" e as seguidas incursões de segmentos da máquina pública pela soberania.Recorreu às investigações sobre o atentado a Carlos Lacerda e a morte de Getúlio Vargas, em 1954, para reforçar sua argumentação."Tivemos em algum momento uma tentativa de autonomização até de CPIs e tivemos no passado a história da chamada República do Galeão. Então, podemos ter problemas de autonomização de processos de investigação. Quaisquer que eles sejam precisamos ter cuidados para que andem dentro dos marcos institucionais."
DISTORÇÃO
Mendes declarou que "num Estado de Direito não há soberanos, todos estão submetidos à lei". "Quando alguém, quando algum setor começa a se autonomizar é porque estamos tendo alguma distorção no modelo de Estado de Direito", ressaltou o presidente do Supremo. "Várias CPIs, em algum momento, se autonomizaram. Tivemos a CPI dos Bingos, não faz muito tempo. E a dos Correios (mensalão).""Podemos falar em algum momento que tivemos medo de que as comissões de inquérito se exacerbassem", insistiu o ministro, dirigindo-se às CPIs. "Tivemos caso, por exemplo, em que uma decisão do Supremo, do ministro Cezar Peluso, foi descumprida por uma CPI, aquela CPI da Pirataria. Disseram não à ordem, alegaram que a orientação era para que não houvesse audiência no período da manhã e que estavam realizando a audiência à tarde. Veja, é o tipo de situação que preocupa. Quer dizer, os órgãos decolam de modelos institucionais."Para ele, tribunal de exceção não é uma definição que se aplica exclusivamente a magistrados que agem em parceria com delegados e procuradores. "Em geral, são órgãos que se autonomizam, quaisquer que sejam eles".O presidente do STF voltou a mirar a "república da polícia", recado direto à Polícia Federal, que tem responsabilidade de investigar corrupção e fraudes na administração pública. "Podemos ter excessos com inquéritos policiais, não é? E assim por diante. Então, é preciso ter cuidado nesse processo para que as instituições funcionem. E quando elas não funcionam é bom que o Judiciário se articule."

Nenhum comentário: