terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Cubanos aguardam com expectativa reforma econômica

Por Roberto Lameirinhas
no Estado de São Paulo

O discurso de posse do presidente cubano escolhido no domingo pela Assembléia Nacional, Raúl Castro, despertou ao mesmo tempo expectativa e cautela entre a população do país. É quase certo que o regime alterará a relação entre o peso nacional, moeda usada pelos cubanos, e o peso conversível, moeda corrente no setor de turismo - embora não estejam claros nem a forma nem o prazo para esse ajuste. Hoje, 24 pesos nacionais valem US$ 1. No caso do peso conversível, US$ 1 equivale a 0,80.“Sabemos que existe uma economia informal importante em pesos conversíveis e, neste momento, os especialistas do governo estudam meios para ampliar o poder de compra do peso nacional sem causar efeitos colaterais, como a inflação”, disse ao Estado Julio Quintero, professor da Escola de Economia e Administração de Havana. Ele, no entanto, evitou estender-se sobre a forma de fazer isso. “Temos gente capacitada cuidando disso”, sentenciou.Entre as duas moedas e uma situação de escassez de produtos constante, o cubano médio submete-se a uma verdadeira ginástica financeira para fechar as contas no fim do mês. Carregador de malas do Hotel Habana Libre, Miguel, de 38 anos, sustenta a família - mulher, que também trabalha, e dois filhos, uma de 9 e outro de 12 anos - com o salário de 250 pesos nacionais (pouco mais de US$ 100) e as gorjetas que recebe em pesos conversíveis, que chegam a ser o dobro do salário oficial na alta temporada de turismo. Ele diz que o discurso de Raúl o deixou otimista, principalmente a promessa de elevar o valor da moeda nacional. “Os alimentos da cesta básica e, às vezes, uma ou outra roupa são comprados pela ‘tablita’ (a cota mensal de produtos vendidos a preços subsidiados a que todos os cubanos têm direito), mas todo mês temos de comprar muita coisa na ‘bolsa negra’. Por sorte, recebo gorjetas em pesos conversíveis. Isso ajuda a completar o orçamento da casa e a pagar as contas de água e de luz”, diz Miguel. Ele conta ainda que o filho mais velho pediu um videogame Atari, daqueles da década de 80, de presente de aniversário. “Encontrei um usado que está sendo vendido por 30 pesos (conversíveis) e estou juntando dinheiro para comprar.”Há quem espere outras medidas do regime, em razão do anúncio de Raúl de que levantará “regulamentações e restrições” que se tornaram obsoletas. O guia turístico André Luis espera que o regime acabe com a proibição de transferir seu carro, um Lada 1990, para o novo dono. O veículo foi vendido em 2004, mas o regime proíbe a transferência de bens financiados com recursos do Estado.Numa situação mais privilegiada, Armando Cortéz, dono de um restaurante “paladar”, em Miramar, bairro no leste de Havana, torce para que o novo governo levante as limitações a esse tipo de negócio privado. Na década passada, os paladares receberam autorização para funcionar como empresas familiares para servir refeições, desde que se limitem a não terem mais do que 12 cadeiras e não ofereçam pratos como lagosta e camarão, para que não concorram com os restaurantes do governo. Há centenas deles em Havana.“Estamos funcionando há dez anos e progredimos bastante, mas é claro que todos nós queremos crescer”, diz. Armando relata que instalou o restaurante - hoje, muito bem cuidado - na casa que era de seu pai. Toda a família de seis pessoas e outros cinco ajudantes trabalham no local. “Eu e outros donos de paladares nos inspiramos em uma novela brasileira, Vale Tudo, na qual a personagem de Regina Duarte abria um pequeno restaurante chamado Paladar, que cresceu e se tornou muito próspero”, explica. “Também queremos prosperar.”

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