sábado, 23 de agosto de 2008

A eleição do vale tudo

Por Ana Paula Verly e Carlos Braga
no Jornal do Brasil

Um mercado negro vem to- mando conta da cidade, se transformando, lentamente, numa das maiores dores de cabeça para o Tribunal Regional Eleitoral, e atinge, de quebra, quem gosta de apreciar a bela vista do Rio. Impedidos de se espalharem pelas ruas por conta das restrições impostas à propaganda eleitoral, os candidatos descobriram nas janelas de apartamentos, fachadas de prédios e terrenos desocupados um filão para a campanha. Porém, a ideologia passa longe de quem cede seus espaços. Denúncias que chegam ao TRE dão conta de que os candidatos estão pagando pelo espaço, o que fere a lei, segundo coordenador de fiscalização de propaganda do TRE, Luiz Fernando Santa Brígida. Os preços variam de R$ 100 a R$ 1.200, de acordo com o bairro e a localização. A prática foi comprovada em duas oportunidades pela reportagem do JB. Pior: o próprio Santa Brígida reconhece estar de mãos atadas para fiscalizar a infração. ­ Recebemos denúncias de pessoas que estão ganhando cesta básica e quantias mensais para instalar as placas, muitas delas na comunidade da Maré. Fomos averiguar, mas ninguém fala nada ­ disse Santa Brígida, ressaltando que a autorização do morador deve ser dada por escrito, o que dificulta ainda mais a fiscalização. Moradores da Barra, que pediram para não serem identificados, disseram que o aluguel mensal para a instalação de placas na Praia dos Amores custa entre R$ 600 e R$ 800. O preço se justificaria por conta do grande número de veículos que passam pelo viaduto do Joá. Em alguns terrenos e no teto de algumas casas é possível ver cartazes de diversos candidatos. ­ A gente percebe que não é por ideologia ­ disse um morador. Para o arquiteto e urbanista Canagé Vilhena há conflito entre a legislação do TRE, que considera permissiva, e a lei municipal. Ele diz que a a legislação eleitoral proibiu a colocação de placas em árvores e postes, mas fez exceção para logradouros ­ o que não é permitido pelo município. A retirada da propaganda das árvores é portes foi uma medida acertada. Mas a autorização para que migrassem para muros, cercas, terrenos baldios, canteiros e fachadas de prédios foi um erro. Vilhena também ataca o jeitinho que alguns candidatos arranjaram para divulgar seu nome para os eleitores: a colocação de cartazes na fachada dos prédios. ­ O certo seria só em residência particular. A rua é de domínio publico. Essa atitude eleitoreira denigre a paisagem urbana e cria um problema para os motoristas ­ critica Vilhena. Disfarce e comprovação Como se fosse assessor de cam- panha, a reportagem do JB entrou em contato com o proprietário de uma casa à beira da Lagoa do Marapendi, na Avenida Ministro Ivan Lins, em cujo muro estavam espetados cartazes de candidatos. O dono disse que, apesar de reconhecer que o espaço estava lotado, poderia abrigar mais um e fez apenas uma exigência: teria que estar presente para fixar a publicidade. Segundo ele, um candidato chegou a oferecer R$ 500 para que retirasse um dos cartazes, substituindo pelo seu. Ele disse que recusou. ­ Já estava fechado e não faria isso. Agora tem o seguinte: quero pagamento adiantado e sem essa de recibo. Eu ajudo vocês e vocês me ajudam a ajudar vocês ­ resumiu. Se a poluição visual de hoje incomoda, a das eleições anteriores a 2004 incomodavam mais. Naquele pleito, o TRE proibiu faixas, cartazes e galhardetes em postes, viadutos e pontes. O tiro, pelo jeito, acabou saindo pela culatra.

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