terça-feira, 29 de abril de 2008

Companheiros em confronto

Editorial do Estado de São Paulo

O PT de Belo Horizonte (BH) pagou para ver até onde o PT nacional será capaz de ir na seqüência da proibição que a comissão executiva do partido impôs semana passada à aliança, na capital mineira, com o PSDB do governador Aécio Neves. O acordo é pela candidatura do secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Márcio Lacerda, do PSB, à sucessão do prefeito petista Fernando Pimentel. Domingo, o diretório municipal peitou a decisão, indicando um companheiro, o deputado estadual Roberto Carvalho, para vice de Lacerda, e abrindo fogo contra a cúpula partidária.O colegiado não se limitou a repudiar ''com indignação'' a negativa à coligação planejada a quatro mãos por Aécio e Pimentel. Documento aprovado no encontro atacou a executiva com palavras que poderiam figurar num manifesto de inimigos radicais do PT. O texto qualifica a proibição de ''postura autoritária, antidemocrática, sectária, preconcebida e predeterminada''. Fala ainda em ''orientação isolacionista'' e em ''tática eleitoral hegemonista e excludente''. E argumenta que o veto ''conflita com o desejo explícito da população e da base partidária''.Com efeito, não paira nenhuma dúvida sobre o apoio do eleitorado local à coligação que governador e prefeito articularam. Seja, como se sabe, porque a grande maioria aprova as administrações de um e outro, seja por entender que o entrosamento entre eles, à parte as siglas a que pertençam, é benéfico para a cidade. Já o apoio da base partidária vem de outro fato sabido: a liderança de Pimentel no PT de Belo Horizonte, que respaldaria o seu projeto de suceder a Aécio - com o aval deste. O governador, de seu lado, teria um trunfo na disputa com o seu colega paulista José Serra pela candidatura tucana ao Planalto e depois, se bem-sucedido, a imagem de arquiteto da união nacional no pós-Lula.Mas é precisamente esse o motivo por que a direção do PT resolveu não aceitar, ''em hipótese alguma'', o acerto em Minas. Em 2010, pela primeira vez, o partido não terá Lula para concorrer ao Planalto, a tomar ao pé da letra as suas juras cada vez mais freqüentes de que não buscará o terceiro mandato. Já não bastasse isso, é uma incógnita a capacidade do presidente de eleger o proverbial poste. E ele mesmo, aliás, acaba de pôr em dúvida as chances de quem seria a sua primeira escolha, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff. ''Entre ser uma figura extraordinária para gerenciar e ser candidata à Presidência é outra conversa'', disse numa entrevista, dias atrás. ''Porque entra um ingrediente chamado política, que exige outras credenciais.''Nesse quadro, tem lógica o PT abominar a idéia de contribuir para o fortalecimento de um adversário potencial, ainda mais, como é o caso de Aécio, que trabalha para ser visto pela opinião pública como o construtor de pontes suprapartidárias visando ao interesse nacional. Se, em Belo Horizonte, a agremiação se unir a ele para sufragar prefeito um dos principais secretários do seu governo - embora de um terceiro partido, que por sua vez integra a base lulista -, com que roupa o presidenciável petista irá enfrentar o tucano, a vingar essa hipótese, no segundo maior colégio eleitoral do País? Nas contas do PT federal, perder este ano a prefeitura de BH com um candidato próprio e, presumivelmente, o governo estadual com Pimentel, ou outro nome, em 2010, é um preço aceitável para conter Aécio.Só que há outro custo em jogo. O PSB não deve aceitar passivamente que o PT prejudique a candidatura do seu correligionário Márcio Lacerda. Muito menos o padrinho dele, Ciro Gomes, que considerou o ato da direção petista ''inexplicável e incompreensível''. (Coerente com a sua insopitada aversão a São Paulo, ele aproveitou para atacar a ''arrogância paulista'' do PT.) Isso é um problema para os planos de Lula de unir toda a coalizão de governo ao redor do candidato que vier a patrocinar à própria sucessão. Daí os sinais aparentemente contraditórios que tem emitido diante do imbróglio. Ele mandou vazar que julgou ''uma burrice'' o veto à aliança com o seu quase-aliado Aécio. Mas é improvável que a decisão tenha saído à sua revelia ou contra a sua vontade.

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