terça-feira, 14 de julho de 2009

Meirelles na mira

Tem muita gente aqui em Goiânia falando que Henrique Meirelles será mesmo candidato ao governo no ano que vem. Relembro algumas denúncias contra o presidente do Banco Central que estiveram nas páginas da imprensa em 2004. A matéria abaixo é da revista Veja:
Meirelles na mira
por Marcelo Carneiro
Henrique Meirelles, presidente do Banco Central, passou a última semana dando explicações sobre uma denúncia publicada pela revista IstoÉ segundo a qual ele teria contas a acertar com o Fisco. O presidente do Banco Central foi acusado de ter apresentado declarações de renda conflitantes à Receita e à Justiça Eleitoral. Atingido por acusações de má conduta fiscal, Luiz Augusto Candiota, diretor de política monetária do BC, pediu demissão. Foi outra enorme contrariedade para Meirelles, para quem a saída de Candiota deu combustível a um escândalo natimorto. Na semana passada, VEJA teve acesso a uma série de documentos cuja vinda à luz pode suscitar novos questionamentos sobre como a fortuna pessoal do presidente do BC é administrada.
Entre a papelada estão procurações de Meirelles para o engenheiro Marco Túlio Pereira de Campos. Primo de Meirelles, Campos foi detido, em maio deste ano, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, quando embarcava para Brasília. Ao passar sua bagagem pela esteira de raios X, o engenheiro foi detido e levado para uma sala da Polícia Federal. Os agentes queriam saber por que o primo de Meirelles tinha, na bagagem, 32.000 reais em dinheiro vivo. Campos identificou-se como parente do presidente do Banco Central e disse que o dinheiro era fruto de uma transação imobiliária realizada em São Paulo envolvendo um dos bens de seu primo. O engenheiro carregava em uma pasta procurações de Henrique Meirelles que lhe davam poderes para representá-lo junto a instituições municipais e estaduais de Goiás e a dois órgãos da União: Receita Federal e Procuradoria da Fazenda Nacional. Ainda havia dois contratos societários e uma escritura de compra de uma chácara na cidade de Anápolis, em Goiás, feita por Henrique Meirelles da empresa Silvania Empreendimentos e Participações Limitada. Marco Túlio Campos – que, em 2002, ajudou na coordenação da vitoriosa campanha de Meirelles a deputado federal – é um homem de confiança do presidente do BC. A Silvania Empreendimentos tem como procurador o próprio Campos. E quem são os donos da Silvania? De acordo com o contrato social, a empresa pertence a outras duas firmas, nomeadas Silvania One e Silvania Two, com sede em Wilmington, cidade no Estado de Delaware, nos Estados Unidos. E a quem pertence a dupla de Silvanias? Ao próprio Henrique Meirelles. Tecnicamente, a operação feita por Meirelles foi a seguinte: como pessoa física, comprou um bem que já lhe pertencia, na qualidade de pessoa jurídica, através da Silvania Empreendimentos. Um técnico da Receita ouvido por VEJA diz que, em tese, não há nenhum ilícito fiscal na transação, mas que operações desse tipo servem, geralmente, para tornar visível aos olhos do Fisco um bem que, até então, estava oculto. No jargão dos auditores, existe a possibilidade teórica de que a transação tenha sido feita para "esquentar" o patrimônio. Meirelles explica que a compra da chácara foi feita em 2002 e lançada, no mesmo ano, em seu imposto de renda – a escritura de compra e venda, porém, só foi lavrada em março deste ano, quando já ocupava o cargo no Banco Central. VEJA perguntou ao presidente do BC se as empresas Silvania Two e Silvania One tinham sido declaradas à Receita. Meirelles explicou que elas pertencem a duas outras holdings que administram praticamente todo o seu patrimônio no Brasil e no exterior, avaliado em cerca de 100 milhões de reais. São essas holdings que aparecem em seu imposto de renda.
Os documentos encontrados pela PF com o primo de Meirelles mostram que ele já estava no comando da política monetária brasileira, em outubro do ano passado, quando criou a empresa Catenária Administração de Bens e Participações. A sócia de Meirelles na empresa, com 0,01% do capital social, é Diva Silva de Campos, sua mãe. O artigo 5º, parágrafo I, alínea B, do Código de Conduta da Alta Administração Federal diz que as autoridades que exercem cargo público devem comunicar à Comissão de Ética Pública do governo federal qualquer alteração relevante em seu patrimônio, especialmente quando se tratar de "aquisição direta ou indireta do controle de empresa". O presidente do BC não cumpriu essa regra, mas diz que fez uma consulta à procuradoria jurídica do banco, que não se opôs a sua participação societária.
Henrique Meirelles é um homem rico, elegeu-se deputado federal por Goiás e construiu seu patrimônio em trinta anos de trabalho no mercado financeiro, boa parte deles morando nos Estados Unidos. Suas operações financeiras, feitas com ajuda de holdings no exterior, aparentemente em nada diferem do que fazem pessoas físicas e jurídicas que conhecem os mecanismos não muito sagrados para minimizar a pesada carga de impostos que incide sobre seu patrimônio e negócios no Brasil. Ocorre que desde sua posse no Banco Central Meirelles implicitamente aceitou ser medido por regras muito mais rígidas. O que pode ser um procedimento levemente reprovável para uma pessoa sem cargo público torna-se algo bem mais sério quando seu autor é o presidente do Banco Central. "Não acredito que uma pessoa na posição do Meirelles tenha se prevalecido de expedientes escusos e, muito menos, ilegais. Mas, quando se está no governo e particularmente no Banco Central, é preciso entender que determinados tipos de operação não podem ser feitos", diz um ex-diretor do BC. Meirelles disse a VEJA estar estarrecido com o fato de ser alvo de denúncias justamente no momento em que a economia começa a decolar. Ele as atribui a interesses contrariados por ele no comando do BC – nada a ver com a taxa de juros, porém. Disse Meirelles: "Deveria agora estar comemorando o fato de ter ocorrido na economia brasileira tudo de bom que eu garanti que ocorreria quando entrei para o BC. Disseram que eu produziria uma recessão no país, e eu ajudei a promover o crescimento econômico, a retomada do emprego e o controle da inflação". Ninguém, em sã consciência, discute os méritos profissionais de Henrique Meirelles à frente do BC. Eles, no entanto, não o eximem de dar explicações sobre questões como as suscitadas pela detenção de seu primo no Aeroporto de Congonhas. Uma das mais embaraçosas delas é como justificar que um sócio e homem de confiança do presidente do BC possa andar com tanto dinheiro em espécie – ainda mais quando se alega que o dinheiro lhe foi dado como parte do pagamento de um imóvel. Não se transacionam imóveis com dinheiro vivo, a não ser quando se quer esconder do Fisco o valor real da transação. Tanto Meirelles quanto um de seus antecessores ouvidos por VEJA concordam que um presidente do BC não pode, pela liturgia do cargo, contaminar suas aparições públicas com explicações sobre sua conduta pessoal. Esse é agora o grande problema de Henrique Meirelles.

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